sexta-feira, novembro 28, 2008

Kids

A minha turma da escola básica do Tojeiro tem 5 pestes masculinas e terroristas. Arrotos, traques, gritos, arrastar cadeiras o mais barulhento possível. Depois de algumas conversas psicológicas, decidi que não podia continuar assim.

A minha turma do Bebedouro, tem também 4 miúdos difíceis, um hiper-activo, um com dificuldade de aprendizagem, outro com muitos problemas em casa, e outro que gosta de chamar a atenção. Mas são diferentes. São traquinas, falam pelos cotovelos, levanta-se sempre que podem, mas não são mal-educados. Então com jeito, firmeza e brincadeira vão lá. Mas os dos Tojeiro são desafiadores e incivilizados.

As nossas instruções para o 1º e 2º ano, são para fazer aulas com muita oralidade e pouca escrita.
Resolvi então, que iam escrever até que lhes caísse os dedos: cópias, ditados, fichas - muitas fichas. melhorou. Ontem já com o volume geral mais baixinho, um deles sobresaía em gritos. Disse-lhe: "Se não te calar eu escrevo uma nota para os teus pais no caderno".
Tipo armado em bom o miúdo responde: "Não é preciso escrever no caderno! Existe a caderneta do aluno!!!!"
Ora bem, isso mesmo - e eu que nem me lembrara de tal coisa - assunto resolvido, e como se soubesse desde sempre da dita caderneta disse:
"Então dá-me lá a tua caderneta de aluno."
Silêncio sepulcral na aula.
"Hi...." ouve-se lá do fundo... Os últimos 10 minutos de aula foram fantástico. Hoje o 1º miúdo foi um anjinho, fez tudo tão bem que até lhe dei um desenho para pintar no final da aula como presente. Repeti a mesma receita com o sr. arrotos-e-traques - notinha na caderneta de aluno- e o ambiente brise e sonoro da aula ficou muito melhor...
Hum...
Acho que as próximas semanas vão ser mais silenciosas.

sábado, novembro 22, 2008

Exame


Hoje foi a Comissão de Exame que declarará se nos acha - os 3 pastores estagiários - dignos de sermos ordenados ao ministério pastoral. no final a Comissão enviou-nos com o texto de Mateus que diz: "Eis que vos envio como ovelhas para o meio de lobos."
Os lobos serão sempre uma constante. Percebi, mas ainda não consigo serenar. Sinto também que para além dos lobos exteriores há uivos interiores que nos afastam da missão e do Reino. Sei que aos lobos se tem que responder com misericórdia, perdão e amor. Mas os uivos mandam-nos gritar a verdade. Erguer bandeiras de guerra contra o mal. Jesus caminhou em amor. Muitas vezes sonhamos com cruzadas. Duro com duro não faz muro diz-nos o povo. Não pela força, nem pela violência, mas pelo meu espírito diz o Senhor.

Medos? Muitos.
Que o afã de ganhar o mundo para Cristo, me faça esquecer dos mais pequeninos. Que a urgência de lutar pela verdade, me faça esquecer a misericórdia.
Espera-se que o pastor seja um exemplo de temperança, longanimidade, dignidade. Olho-me ao espelho e vejo um ser humano, nem melhor nem pior. Um ser humano: bondade e maldade. Perdão e ressentimento.

Medo? Que os meus erros se tornem pedra de tropeço. Que me esqueça que viver o Reino de Deus é claridade, entusiasmo, força, vitória. E... Alegria. Alegria. Alegria.
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Imagem: my_heart_is_in_your_hand_Barbara_Bagshaw

sexta-feira, novembro 21, 2008

Finitude


E de repente um amigo tem um AVC. Outra fica numa cama de hospital dias a fio. Morrem amigos. E damos conta que a juventude passou. Que o tempo de entrarmos surpresos nas estatísticas de doenças graves e prolongadas chegou.
40 anos. A meio da caminhada. O tempo da ascenção ficou para trás. O nosso corpo vai cedento. A nossa vida como as barrinhas dos downloads avança afanosamente. Carpen diem. A segurança inconsciente dos anos em que pensamos que temos muitos pela frente e por isso não pensamos, disolve-se.
Quero sorver a vida. Há tantas coisas que quero estudar, saber, fazer, ser.

quarta-feira, novembro 12, 2008

Macedónia

CASAMENTO
Este sábado celebrei a primeira bênção matrimonial. A minha colega (Sandra) e eu somos pastoras todo o terreno: Escolhemos as passagens bíblicas, elaborámos e imprimimos a liturgia, fizemos o tradicional powerpoint com as fotos dos noivos, abrimos a porta da igreja, salvámos o vestido da noiva pois a familiar-decoradora tinha prantado velinhas mesmo no sítio onde passaria e se instalaria o vestidinho - na verdade salvámos também o vestido da madrinha do noivo que estava sentada com uma saia com bainha de tule a 20 cm do chão onde ardia espevitada uma outra velinha. Pusemos a marcha nupcial, fizemos a cerimónia, colocámos de novo a marcha para a saída e ficámos a varrer o arroz do chão e a tirar as flores dos bancos da igreja. Serviço completo.

CASAMENTO meu. (hoje fazemos 4 meses) O marido arranjou trabalho em Coimbra!!!! A partir de Dezembro vamos viver juntos!

ECONOMIA. A crise aperta. Esta semana comecei a dar aulas de inglês em escolas primárias aqui da zona. Como são escolas pequenas tenho turmas com todos os 4 anos juntos. É um desafio. Dar 4 anos em 45 minutos. Mas sinto-me feliz. Levo a viola - encontrei uns livros na livraria britânica com músicas inglesas giras - depois da música as fichas com os trabalhos parecem melhores. Gosto muito de crianças e é óptimo cantar e fazer jogos, ensinar que inglês pode ser interessante, útil e divertido. Mas há crianças com problemas. Algumas têm o olhar parado, outras são desconfiadas, outras não conseguem deixar de bater, empurrar, gritar. Nota-se tão bem as crianças amadas. Podem ser tímidas, mas há uma calma, uma serenidade. Podem ser expansivas, mas o sorriso é feliz. As crianças sofridas têm já nesta idade um peso. Quero muito poder ajudá-las.

Já disse que o marido vem viver cá para cima?

MILAGRE. O M. salvou-se. Depois do AVC os médicos não deram esperança. O amigo do M. que me ligou, entrou em contacto comigo principalmente para me preparar para o pior. Durante 15 dias depois do AVC o M. estava em coma profundo. Depois que as pessoas da igreja souberam e começaram a orar, de repente houve melhoras. 1º Desligaram-se umas máquinas: o M. já respirava por ele. Depois ele apertava a mão: os médicos advertiram que podiam ser movimentos sem razão. Pouco a pouco o Miguel reagia à presença dos amigos e familiares apertava a mão respondendo e depois sorria ou franzia as sobrancelhas. Pouco a pouco os olhos foram recuperando a alma. Ninguém esperava, mas a partir do dia exacto em que começámos a orar o M. começou a melhorar. Agora foi para Alcoitão. Consegue ler, tem as mesmas posições políticas e éticas - ou seja continua a ser ele e já diz umas palavras.
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Durante o tempo em que esteve no hospital, os doentes e famílias do quarto e os enfermeiros pasmavam primeiro e sabiam depois que o M. tinha visitas o dia todo, mais de 10 pessoas por dia passavam pela sua cama. Homens feitos que se escusariam a dar de comer a uma avó ou idoso da família com o pretexto de que não tinham jeito, largavam jornais, revistas, os testes para corrigir da faculdade e empurravam colherada a colherada as papas que o M. tinha que comer. Era comovente. Senhoras da igreja, que faziam leite-creme e lhe levavam, faziam "excursões" ao hospital, lhe diziam: "M. eu gosto de si como se fosses meu filho ou meu neto, precisamos de si." A doença trouxe proximidade, toque e cuidado que a saúde jamais permitiria.

sábado, novembro 08, 2008

Onde se fala de movimentos ad intra

A minha amiga repreende-me por nunca mais escrever. E de repente percebo que não escrevo há quase um mês!!! Sinto-me a retrair como se não quisesse partilhar o que sinto e penso. É interessante estes movimentos de alma. Há 2 anos atrás não conseguia guardar o que pensava, tudo o que me vinha à cabeça queria desesperadamente publicar aqui. Agora é como se um pudor cobrisse o que penso. Não sei se é por viver sozinha há já 2 anos. Mas é como se as palavras custassem a sair.

Tudo aquilo que realmente pertence ao ser humano são os poucos cm 3 do seu cérebro. Aquilo que penso pertence-me inteiramente e ultimamente, sinto que é tudo demasiado pessoal. Não sei se é por ter vindo para novas realidades onde tenho que me expôr e dar a conhecer. Não sei se este mês onde falava o dia inteiro sobre mim, a minha igreja, o meu país, as minhas ideias, as minhas teorias... ainda me contraíram mais...

Mas sinto-me a fechar.