Saudades do Futuro
Dentro de 4 meses começo o meu Estágio Pastoral na Igreja Evangélica Presbiteriana de Portugal.
Ser pastora foi algo que surgiu na minha vida como surpresa. Ainda estou a digerir o facto. Vinda de uma cultura muito evangelica-misógenia, é um desafio pensar que vou ser talvez uma das 10 pastoras existentes em Portugal. (não estou a contar as mulheres que o são porque casaram com pastores...)
Eis que faço novas todas as coisas! (Ap. 21:5)
Este grito de promessa da parte de Deus é a frase que me vai guiando neste último ano de estudos… e que senti que deveria ser o meu lema para o futuro. Durante o último verão fui fazer as férias de um pastor na zona de Abrantes e enquanto trabalhava nas 3 comunidades da Zona fui-me apercebendo dos desafios que se me punham. Estas foram os desafios que senti, estas são as questões que penso serem prementes para desenvolver o meu ministérios:
1. Discernimento dos tempos. Percebi que no meu trabalho pastoral devo estar atenta às mudanças do tempo, as comunidades são algo volátel, não existe uma comunidade estática para a qual se pode fazer o mesmo tipo de pastoral durante vários anos. Vivemos num mundo que muda à velocidade da luz e como tal, a nossa pastoral deve também estar atenta às necessidades que mudam velozmente. Flexibidade e capacidade de mudar a forma de discurso, de acordo com as gerações que surgem foi uma das coisas que percebi ser de importância primordial para que as nossas Igrejas se não esvaziem.
2. Abertura. A Igreja tem que ser carismática, estar aberta ao desassossego do Espírito e disposta a seguir a sua direcção. Sem o Espírito as Igrejas fecham-se nas suas doctrinas, a liturgia cristaliza-se, a esperança é substituída pelo instinto de conservação, o radicalismo do anuncio desaparece.
Olhar o outro e perceber as suas necessidades em vez de tentar pescar almas ou fazer uma colheita que multiplique a nossa comunidade foi uma das decisões que tomei quando olhei as pessoas fora e dentro da igreja e percebi o quão necessitadas de empatia e compreensãos estão. Percebi que a minha filosofia de ministério teria de ser a de levar o Reino de Deus para fora da Igreja e não de trazer as pessoas para dentro. Uma das características que sinto que a minha pastoral deve ter é a de acolher. A comunidade deve ser uma comunidade emocional, onde a segurança do santuário dá forças para continuar o caminho de anúncio e serviço.
3. Estar. Vinda de uma escola de Cristianismo activista, percebi que as pessoas precisam que eu esteja aberta e disponível por dentro: Aberta a Deus e à comunidade. Mostrar Deus e o que eu sinto por Deus. Mais do que fazer, elas querem que eu esteja; mais do que ver actividade, querem ver quem eu sou; mais do que ouvir, sinto nelas a necessidade de conversar.
4. Diversidade biblica. Não há uma mensagem uniforme, não há um padrão fixo de fazer comunidade. Se olharmos o canon bíblico percebemos que cada evangelho, cada livro da bíblia tem uma abordagem especial, um enfoque diferente. A Bíblia é uma celebração de diversidade, uma explosão de variedade e muitas vezes a Igreja tende a desenvolver um discurso monocórdico, aborrecido e irrelevante. Procurar este arco-íris de celebração entre o divino e o humano, vai ser um desafio constante que terei que ter presente.
5. Clivagem entre a forma como eu ouvi e recebi a mensagem do evangelho e a linguagem que hoje se fala no mundo. Percebi que muitas palavras que cimentam a minha fé não significam nada para as novas gerações. Há uma necessidade urgente de mestiçar a linguagem “divina” que um dia nos levou a Cristo, com os dialectos que hoje são canais de comunicação.
6. Oração. Na oração aprendemos a derribar preconceitos, a criar laços, a experimentar a comunhão da presença de Deus.
7. Falta de esperança. Recordando um passado de igrejas cheias e de celebrações felizes, os crentes olham para o futuro sem esperança. Sinto que esta esperança tem que vir de uma identidade forte. Essa identidade forte que somente o Espírto do Senhor nos pode dar, uma identidade que ultrapassa barreiras culturais, respeita a diversidade e tem uma mensagem profética para cada um.
8. Contar histórias. Ser comunidade é dar espaço à partilha de experiencias. Descobri que será importante que eu possa dar espaço para que cada crente possa contar a sua a história pessoal com Deus e que daí perceba que já está a “evangelizar”: partilhar história e presença de Deus é liturgia, que vai para além da rotina dos rituais; partilhar história é criar uma consciência profética em cada crente.
9. Solidão/Apoio. Percebi o quão solitário pode ser o trabalho de pastor e a necessidade que sentirei de ter colegas perto com quem possa partilhar alegrias e tristezas, comunhão e travesias de desertos.
Estou a viver este último ano de seminário, indo ao encontro do caminho que Deus promete a cada um de nós. Estou a viver este ano com saudades do futuro.
Aguarela de Elmer Yazzie
2 Comments:
tudo a correr bem!
obrigada pela tua reflexão... estava a pensar que a minha igreja poderia fazer uma reflexão semelhante para perceber o que é que a comunidade à sua volta necessita....
Xana
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